Em 31.12.2020
esgota-se a vigência do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, criado pela
Emenda Constitucional nº 53, de modo que o Congresso Nacional tem debatido,
desde 2015, propostas alternativas com vistas a renovar os compromissos do
Fundo, porém num patamar de investimento superior ao atual e de maneira perene
para atender mais adequadamente as necessidades dos sistemas de ensino.
O FUNDEB
sucedeu o Fundo do Ensino Fundamental – FUNDEF e se transformou em principal
política de financiamento da educação básica, pelas seguintes razões, entre
outras:
1. Atua no
combate às desigualdades socioeconômicas e regionais, uma vez que a vinculação
de recursos do art. 212 da Constituição não é suficiente para assegurar padrão
de qualidade na educação básica do país. Além da vinculação é preciso maior
cooperação entre os entes federados;
2.
Proporcionou a ampliação das matrículas no nível básico, embora permaneçam
pendentes os compromissos de universalização do atendimento escolar com
qualidade e de eliminação do analfabetismo literal e funcional;
3. Ampliou
o regime de cooperação entre os entes federados, com maior participação da
União no financiamento da escola básica, dado que essa esfera administrativa
concentra quase 60% da partilha dos tributos nacionais;
4. À luz
do item anterior, ajudou a equilibrar o pacto federativo, haja vista os
municípios deterem cerca de 18% da arrecadação tributária e os estados 25%,
porém esses entes são responsáveis, respectivamente, pelo atendimento de 43% e
35% do total das matrículas escolares. Sem contar que o Custo Aluno na educação
infantil, de responsabilidade dos municípios, é o maior entre todos da educação
básica;
5.
Proporcionou a implementação de políticas de valorização dos profissionais da
educação, como o piso salarial do magistério, a jornada de trabalho extraclasse
aos professores e a ampliação da formação e de planos de carreira para o
conjunto dos profissionais da educação (magistério e funcionários da educação).
Uma das
propostas de emenda à constituição que tramitam no Congresso Nacional para
renovar o FUNDEB é a PEC 15, de 2015, sendo ela a precursora do debate
parlamentar na Câmara dos Deputados. O Senado Federal também tem discutido
outras duas propostas, com destaque para a PEC 65, de 2019, protocolada por
todos os partidos com representação no Senado, a pedido do Fórum de
Governadores.
Assim como
a sociedade em geral que acessa diariamente as escolas públicas brasileiras,
também os gestores municipais e estaduais estão preocupados com a extinção do
FUNDEB em 2020, sem a consequente renovação do Fundo. Isso porque o FUNDEB
concentra mais de 60% dos recursos investidos na educação básica, sendo responsável
pela equalização no atendimento escolar em mais de 70% dos municípios
brasileiros. Ou seja: o efeito redistributivo do Fundo da Educação Básica não
se dá apenas nos estados que recebem a complementação federal, mas em todos os
demais, através do aporte equalizador entre o ente estadual e seus municípios.
Essa
engenharia redistributiva dos recursos educacionais poderá ainda ser melhor
aplicada caso o novo FUNDEB aumente o percentual de complementação da União aos
fundos estaduais, adotando novo critério de cálculo para o Valor Aluno Ano com
base nas receitas totais de cada ente federado. Neste caso, será possível
ampliar o efeito equalizador do FUNDEB para quase 100% dos entes federados,
possibilitado maior investimento per capita das matrículas e melhores condições
para valorizar os profissionais da educação.
Mesmo com
o esforço do atual FUNDEB, o Brasil se mantém como um dos países com menor
investimento por estudante na educação básica. Segundo dados da pesquisa
Educacion at Glace 2019, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), em 2017, o investimento per capita anual na educação básica
brasileira foi de US$ 3.800 por estudante no ensino fundamental 1 (sendo US$
8.600 a média da OCDE), US$ 3.700 por estudante no ensino fundamental 2 (contra
a média da OCDE de US$ 10.200) e US$ 4.100 por estudante no ensino médio e
técnico (estando a média da OCDE em US$ 10.000). A mesma defasagem ocorre no
nível salarial do magistério.
Nossos professores e professoras se mantêm na
última colocação na pesquisa da OCDE, percebendo remuneração média anual de US$
14.775, contra US$ 33.058 dos países que integram a OCDE, US$ 60.507 da
Alemanha e US$ 23.747 do Chile.
Não há
outra alternativa para alterar esse cenário de baixo investimento educacional
no Brasil, senão pela renovação e transformação do FUNDEB em política
permanente, com mais recursos para a escola pública e com perspectiva de
alocação das receitas à luz do critério de Custo Aluno Qualidade. Por isso,
defendemos as seguintes diretrizes para a PEC 15 e suas correlatas:
-Manutenção das receitas vinculadas à educação (art. 212 da CF) à luz dos
debates de reforma tributária e pacto federativo que ocorrem paralelamente ao
FUNDEB;
-Aumento
da complementação da União para 40% do total das receitas dos fundos estaduais;
-Inclusão
de novas receitas orçamentárias na cesta do FUNDEB para financiar o CAQ;
-Distribuição equitativa dos recursos do FUNDEB, sem a aplicação de critérios
meritocráticos entre redes de ensino que possuem realidades díspares (o que
poderá comprometer o objetivo central da política);
-Vinculação das receitas do FUNDEB às matrículas das redes públicas, sem
permissão de vouchers ou outras formas de alocação desses recursos na rede
privada.
-Instituição do CAQ como referência para o financiamento escolar, adotando-se o
cálculo do Custo Aluno sobre as receitas totais da educação em cada ente
federado;
-Aperfeiçoamento dos critérios distributivos da complementação da União, com
vistas a melhorar a equalização do atendimento escolar;
-Previsão
de prazo para regulamentar o piso salarial profissional nacional previsto no
art. 206, VIII da CF, de abrangência para todos os profissionais da educação.
Diante da
recente proposta do governo federal de reformulação do pacto federativo, com
destaque para (i) o repasse da cota federal dos royalties da União aos estados
e municípios, sem vinculação para a educação, (ii) a extinção do Fundo Social
do Pré-sal e de suas vinculações de receitas para as áreas sociais, entre elas,
a educação, (iii) a junção das vinculações de saúde e educação numa só rubrica
e sem aumento dos recursos para essas áreas sensíveis da sociedade, (iv) a
transferência da cota federal do salário educação para os entes subnacionais,
desresponsabilizando a União de ações supletivas e equalizadoras do atendimento
escolar, a CNTE chama a atenção dos gestores estaduais e municipais para os
perigos dessas medidas que não resolverão os problemas da injusta partilha
tributária entre as três esferas administrativas, e que certamente agravarão os
problemas do atendimento com qualidade nas áreas de educação e saúde, gerando
maiores conflitos aos entes responsáveis pelo atendimento dessas políticas
públicas.
O
verdadeiro pacto federativo deve se dar pela maior e melhor distribuição das
riquezas nacionais entre os entes federados e a população, com garantia de
melhor atendimento das políticas públicas à sociedade. E o FUNDEB é um dos
mecanismos que mais promove a equidade e a qualidade na educação, devendo seu
mecanismo de distribuição ser ampliado a todos os estados e municípios através
de maior participação federal no Fundo Público.
Em razão
do prazo exíguo para aprovação da PEC 15/2015 e da subsequente lei de
regulamentação do novo FUNDEB, convocamos os gestores públicos, os parlamentares
municipais, estaduais e federais, além da sociedade em geral, a integrar a
mobilização nacional em defesa do FUNDEB permanente e com mais recursos para a
educação.
Diretoria da CNTE