segunda-feira, 31 de agosto de 2020

JUÍZA FEDERAL DETERMINA A EXCLUSÃO DA UNIÃO DO PROCESSO DO PRECATÓRIO DO FUNDEF DE OURICURI

 31-08-2020-BOLETIM DO PRECATÓRIO (MAIS UMA DECISÃO JUDICIAL FAVORÁVEL AOS PROFESSORES DE OURICURI  


PROCESSO Nº: 0800195-74.2020.4.05.8309 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RÉU: MUNICIPIO DE OURICURI

ADVOGADO: Wilker Ferreira Dos Santos

27ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 

 

 

 S ENT E N ÇA

 

 

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de Ação Civil Pública com pedido de tutela provisória de urgência, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face do MUNICÍPIO DE OURICURI, por meio da qual  pretende,  em  suma, garantir a vinculação e a subvinculação das verbas oriundas do Fundef/Fundeb, decorrentes de precatório judicial.

 

Em decisão contida no id. 4058309.14521200, o juízo deferiu o pedido de tutela antecipada para:

 

(i)     declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade incidental do item  9.2.1.2  do  acórdão 1.962/2017 - TCU - Plenário; dos itens I e II da decisão cautelar monocrática referendada no Acórdão 1518/2018 - TCU - Plenário; e do item 9.2.1 do Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário.

 

(ii)   determinar ao Município de Ouricuri que, ao utilizar as verbas do precatório decorrente do FUNDEF/FUNDEB,  observe:

 

(a)  a vinculação na aplicação exclusiva na educação, sob pena de multa de 1% sobre o valor utilizado em qualquer área que não seja a educação, a ser suportado pelo prefeito do município de Ouricuri.

 

(b)  a subvinculação prevista no art. 60, XII do ADCT, devendo destinar pelo menos 60% de todos os recursos oriundos do precatório no pagamento dos profissionais do magistério da educação básica que, nos exercícios financeiros e meses correspondentes ao precatório, exerciam efetivamente a atividade e na proporção de tempo que o fez, sob pena de multa de 1% sobre o valor utilizado sem a subvinculação, a ser suportado pelo prefeito municipal de Ouricuri. Em caso de óbito, os valores devem ser destinados aos sucessores.

 

(iii)  determinar que o Município de Ouricuri, no prazo de 60 (sessenta) dias, elabore um plano de aplicação dos recursos, conforme a recomendação contida no Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário, o que deverá ser feito em participação com o sindicato dos professores no tocante aos 60% subvinculados. Deverá o referido plano ter ampla divulgação, devendo o Município promover, no que


 

 

diz respeito ao plano:

 

(a)  a ciência do respectivo conselho do FUNDEB;

 

(b)  a ciência dos membros do Poder Legislativo local;

 

(c)  a ciência da comunidade diretamente envolvida; e

 

(d)  a sua juntada nos autos, no prazo concedido para a sua elaboração.

 

A União Federal apresentou contestação (id. 4058309.15112530), pugnando  pela improcedência do pedido na parte da subvinculação de 60% dos recursos oriundos do precatório ao pagamento de profissionais do magistério da educação básica.

 

Sobreveio aos autos decisão liminar no Agravo de Instrumento de n.º 0808016-30.2020.4.05.0000, tendo-se determinado a suspensão parcial da tutela concedida, nos seguintes termos: "o pedido liminarmente requestado no presente recurso para sobrestar, ao menos até o julgamento de mérito do agravo de instrumento em referência, os efeitos advindos da decisão combatida no tópico em que declarou a inconstitucionalidade incidental do item 9.2.1.2 do Acórdão 1.962/2017 - TCU - Plenário; dos itens I e II da decisão cautelar monocrática referendada no Acórdão 1518/2018 - TCU - Plenário; e do item 9.2.1 do Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário" (id. 4050000.21432841).

 

O Município de Ouricuri apresentou plano de aplicação de recursos financeiros referente a 60%  do montante do precatório judicial (id. 4058309.15399100).

 

Em seguida, este juízo indeferiu o pedido de habilitação de EDEILTON TORRES DE SOUZA como terceiro interessado, deferiu o pedido de intervenção do SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS DE OURICURI - SINDSEP, na qualidade de assistente e também deferiu o pedido  do  Município  de Ouricuri para liberar 40% do montante do precatório judicial pago no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública de n.º 0001628-77.2005.4.05.8308 (id. 4058309.15291774).

 

A União opôs embargos de declaração (id. 4058309.15545704).

 

ADEMAR PEREIRA LOPES JÚNIOR e outros requereram habilitação nos autos (id. 4058309.15605997).

 

O Sindicato dos Servidores Públicos do Município de Ouricuri informou que o plano de aplicação dos 60% foi amplamente divulgado entre os profissionais do magistério em site do sindicato, redes sociais e outros canais de comunicação (id. 4058309.15616263).

 

Manifestou-se a União esclarecendo que atua no polo passivo da demanda, por competir ao ente federal assegurar a constitucionalidade e a legalidade dos Acórdãos do TCU (id. 4058309.15644016).

 

Requereu o MPF o julgamento antecipado da lide, bem como a inadmissão da União como terceiro ou parte e reiterou o pedido de inadmissão da Confederação dos servidores públicos neste feito (id. 4058309.15669540). Na oportunidade, juntou documentos.

 

Por fim, o Sindicato dos Servidores Públicos do Município de Ouricuri pugnou pelo julgamento antecipado do mérito (id. 4058309.15693441).

 

É o relatório.

 

 

 

FUNDAMENTAÇÃO

 

Comporta a demanda julgamento antecipado, devido à controvérsia poder ser dirimida por meio da prova documental acostada aos autos, prescindindo de produção de prova em audiência, como autoriza o art. 355, I, do CPC.


 

 

a)  Da intervenção de pessoas físicas no feito

 

Verifico que ADEMAR PEREIRA LOPES JÚNIOR e OUTROS, em petição id. 4058309.15605997 requereram a habilitação no feito, sob o fundamento de que seriam profissionais do magistério em efetivo exercício no Município de Ouricuri. Inclusive, na petição 4058309.15713446, insurgiu-se quanto ao julgamento antecipado da lide.

 

Ocorre que a presente Ação Civil Pública visa a garantir a aplicação em educação e a subvinculação das verbas oriundas do Fundef/Fundeb, decorrentes de precatório judicial, em conformidade ao ordenamento jurídico pátrio.

 

Assim, o objeto principal desta demanda consiste no resguardo  de direito coletivo, de titularidade dos munícipes de Ouricuri, atinente à proteção da educação.

 

Dessa forma, não interesse de qualquer cidadão no ingresso da lide, visto que a presente ação não lhe pertine individualmente. Isso porque,  diferentemente  das  hipóteses  de  interesses  individuais homogêneos, não qualquer direito a uma quota-parte a ser defendida nesta demanda, sendo ausente, pois, qualquer interesse jurídico.

 

Assim, indefiro o pedido de habilitação de ADEMAR PEREIRA LOPES JÚNIOR e OUTROS como terceiros interessados, devendo as petições e os documentos por eles acostados serem desentranhados deste demanda.

 

 

 

b)  Da intervenção da Confederação dos Servidores e Funcionários Públicos das Fundações, Autarquias e Prefeituras Municipais - CSPM

 

Peticionou a CSPM, representado por Aires Ribeiro, diretor presidente da entidade, a habilitação no feito, por ser entidade sindical apta a representar os professores da rede municipal de ensino de Ouricuri.

 

No entanto, conforme apontado pelo Ministério Público Federal, a confederação sequer demonstrou que Aires Ribeiro é, de fato, presidente da entidade, por ausência de documentos, havendo, assim, defeito de representação.

 

Intimada a apresentar a cópia do último estatuto ou contrato social consolidado e da  documentação societária outorgando poderes de representação, a entidade permaneceu silente.

 

Dessa forma,  não resta outra  alternativa além do indeferimento do pedido de habilitação, haja vista o defeito de representação e a inexistência de qualquer prejuízo ao deslinde processual, uma vez  que  a categoria dos profissionais do magistério está devidamente representada pelo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Ouricuri - SINDSEP.

 

 

 

c)  Dos embargos de declaração

 

A União Federal opôs embargos de declaração, sob o fundamento de existir omissão e obscuridade na decisão id. 4058309.15291774.

 

Alegou que "a decisão ora embargada, ao determinar a liberação do precatório (40%), foi omissa quanto à determinação de que as verbas precisam ser utilizadas com a vinculação determinada no Cumprimento de Sentença de n.º  0001628-77.2005.4.05.8308".

 

No entanto, não qualquer omissão. Não cabe à decisão embargada reiterar a decisão homologada no processo de n.º 0001628-77.2005.4.05.8308. Eis que o referido acordo, uma vez homologado, deve ser cumprido pelo município, sem necessidade de reiterar a obrigação de cumprir decisão judicial.

 

Ademais, aduziu que "a decisão embargada, portanto, ao determinar a intimação das partes para se manifestar acerca do plano de aplicação dos recursos apresentado pelo Município, foi omissa e obscura quanto aos efeitos da Decisão  do  Agravo  de  Instrumento   0808016-30.2020.4.05.0000,  a  ensejar  também  a  oposição  dos  presentes


 

 

aclaratórios".

 

É sabido que, liminarmente, em sede do Agravo de Instrumento de n.º 0808016-30.2020.4.05.0000 (não se tem conhecimento do julgamento colegiado do recurso), foi determinado o sobrestamento  dos  "efeitos advindos da decisão combatida no tópico em que declarou a inconstitucionalidade  incidental  do  item  9.2.1.2  do Acórdão 1.962/2017 - TCU -  Plenário; dos itens I e II da decisão cautelar monocrática referendada no Acórdão 1518/2018 - TCU - Plenário; e do item 9.2.1 do Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário".

 

No entanto, a intimação é ato processual que garante o conhecimento, pelas outras partes litigantes, de qualquer manifestação ocorrida no processo, como é o caso do plano de aplicação de recursos elaborado pelo município.

 

No caso, os efeitos da decisão que deferiu a tutela antecipada, qual seja, a subvinculação do montante ao pagamento dos profissionais do magistério, na proporção de pelo menos 60%, conforme o art. 60, XII do ADCT, permanecem sobrestados, uma vez que os professores não receberam quaisquer valores.  Nada impede, contudo, que o juízo promova a prática de atos destinados ao julgamento do feito.

 

De todo o exposto, conheço dos embargos declaratórios para negar-lhes provimento, na medida em que não verificados os defeitos anunciados.

 

 

 

d)  Da intervenção da União Federal

 

Este juízo, ao deferir a tutela antecipada, intimou a União para, caso assim entendesse, comunicasse seu

interesse em intervir neste feito.

 

Entretanto, o que se observa é que a primeira manifestação da União Federal no feito foi com a apresentação de contestação, mesmo não figurando no polo passivo da demanda. Ademais, não expressou eventual interesse do ente federal em integrar o feito como terceiro interessado, limitando-se a contestar o objeto da demanda, por irresignação ao pedido.

 

Ainda, instada expressamente a esclarecer a que título tem peticionado no feito, a União informou que está presente nos autos apenas para defender a higidez dos Acórdãos do Tribunal de Contas da União, vergastados na inicial.

 

Aqui, impõem-se algumas considerações.

 

O valor pago pela União ao Município, por meio de precatório judicial, decorre, em verdade, de complementação de verbas federais não pagas. Assim, trata-se de verba que, tão logo  sejam liberados, incorporar-se-á ao patrimônio da municipalidade.

 

Dessa forma, forçoso concluir que o objeto principal desta demanda consiste no resguardo  de  direito coletivo, de titularidade do município demandado, atinente à proteção da educação, uma vez  que  a presente Ação Civil Pública objetiva garantir a aplicação em educação e a subvinculação das  verbas oriundas do Fundef/Fundeb, decorrentes de precatório judicial, em conformidade ao ordenamento jurídico pátrio.

 

Assim, o que se observa é que não qualquer razão para que a União Federal figure no polo passivo da presente demanda, na medida em que somente se discute a aplicação de verbas de propriedade do município, sendo totalmente ilegítima, mesmo porque nada foi pedido em face da União, tampouco se está diante de litisconsórcio passivo necessário.

 

Existe, ao revés, verdadeira contradição no comportamento do ente federal no feito.

 

Não dúvidas de que, pelo teor da contestação apresentada, a União possui opinião contrária ao pleito ministerial e tenta influenciar na resolução da demanda com a apresentação da referida peça, mesmo sem ser ou tampouco pedir seu ingresso na lide na condição de assistente.

 

Contudo, em demanda promovida pelo SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS DE OURICURI - SINDSEP (processo 0800233-23.2019.4.05.8309), a União peticionou afirmando não possuir


 

 

interesse em integrar a relação processual sob o seguinte fundamento (vide id. 4058309.10987935 daqueles autos):

 

A questão debatida nos presentes autos é a aplicação de proporção não inferior a 60% dos recursos ao pagamento dos professores. Nesse particular, inexiste interesse da União na lide, visto que:

 

a)    A competência para a aplicação dos recursos do Fundef e do Fundeb pertence aos entes governamentais beneficiários, no âmbito de suas respectivas esferas de atuação prioritária (art. 211 da Constituição Federal de 1988), conforme previsão constante d o art. da Lei 9 .42 4 de 1996 (relativamente ao Fundef) e d o art. 21 da Lei 11.494 de 2 007 (relativamente ao Fundeb);

 

b)   A parcela da complementação  da União, por encontrar-se constitucional mente vinculada aos Fundos, integra-se aos montantes repassados por meio do Fundef e do Fundeb, de modo que a sua titularidade pertence a os entes governamentais beneficiários dos recursos;

 

c)  A gestão dos recursos do Fundeb compete aos órgãos responsáveis pela Educação (art. 69, § 5°, da Lei 9. 394 de 1996) , no âmbito dos respectivos entes governamentais, sendo que a responsabilidade pela aplicação dos recursos pertence, consequentemente, aos poderes públicos  locais, incumbindo-lhes, posteriormente, a prestação d e contas aos órgãos de fiscalização e controle (art. 26, II, 27 da Lei 11.494/07) .

 

Como bem expôs o Ministério Público Federal, está-se diante de comportamento contraditório, apto a caracterizar a violação da boa-fé objetiva da União Federal, que ora afirma que os valores objetos desta Ação Civil Pública são de titularidade do ente governamental beneficiário do Fundef/Fundeb e, por isso, não seria de seu interesse integrar a demanda, ora espontaneamente interpõe agravo de instrumento  e contesta a demanda, sem sequer figurar no polo passivo ou mesmo pedir ao juízo sua intervenção, em quaisquer das modalidades previstas no Código de Processo Civil.

 

Ora, considerando que o ente federal não é parte no feito, eis nada contra ele nada foi pedido; determino sua exclusão do feito.

 

 

 

e)  Da legitimidade do Ministério Público Federal e da competência da Justiça Federal

 

Importa ressaltar que a atuação do Ministério Público Federal decorre da função institucional deste órgão em zelar pela educação, em conformidade ao art. 5º, V, "a" da Lei Complementar n.º 75 de 1993, a qual dispõe que:

 

Art. São funções institucionais do Ministério Público da União:

 

V - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de relevância pública quanto:

 

a) aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações  e aos  serviços de saúde e à educação;

 

Ora, em última análise, esta demanda ultrapassa a discussão de destinação de verbas municipais. Isso porque, em se tratando de valores provenientes de complementação do Fundef/Fundeb, os quais são constitucionalmente vinculados à educação, este é o bem jurídico a que se procura tutelar nesta Ação Civil Pública.

 

Esse também é o entendimento da jurisprudência, conforme se observa no seguinte julgado:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MPF - MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. VERBAS DO FUNDEF. LEGITIMIDADE ATIVA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. EXAME DE MATÉRIA NÃO APRECIADA PELA DECISÃO AGRAVADA. IMPOSSIBILIDADE. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AGRAVO CONHECIDO EM PARTE, E NA PARTE CONHECIDA, PROVIDO.

 

1. Agravo de instrumento interposto pelo MPF - Ministério Público Federal contra decisão que, nos autos da ação civil pública, declinou da competência em favor da Justiça Estadual


 

 

para o processamento da referida ação em desfavor do Município de General Sampaio/CE. [...]

 

3.   A jurisprudência do egrégio STF - Supremo Tribunal Federal é pacífica quanto à existência de atribuição - e a consequente legitimidade ativa - do Ministério  Público Federal para investigações e ações cíveis que versam sobre aplicação de recursos repassados pela União a título de complementação do FUNDEF e FUNDEB.

 

4.   Reconhecimento da legitimidade ativa do Ministério Público Federal  para  figurar como litisconsorte ativo da ação civil pública visando vincular à educação o valor a ser recebido pelo Município, via precatório, em razão da complementação a menor do FUNDEF pela União, bem como da competência da Justiça  Federal  para  processar  e julgar o feito. [...]

 

6.  Precedente do colendo STF.

 

7.  Agravo de instrumento conhecido em parte, e na parte conhecida, provido.

 

(PROCESSO: 08136949420184050000, AG - Agravo de Instrumento - , DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ LUIS MAIA TOBIAS GRANJA (CONVOCADO), Turma, JULGAMENTO: 01/02/2019, PUBLICAÇÃO: )

 

Dessa forma, verifico que a atuação do Ministério Público Federal, in casu, é totalmente legítima, no âmbito de suas funções institucionais, além de ser digna de reconhecimento, tendo em vista o empenho do órgão ministerial ao resguardo do direito social à educação.

 

Esclareço ainda que a atuação do Ministério Público Federal independe da presença da União Federal no feito, sob pena de serem as funções institucionais do Parquet injustificadamente suprimidas, em latente violação ao art. 129, III da Constituição Federal.

 

Isso posto, considerando a presença do Ministério Público Federal, no polo ativo da demanda, torna-se irrefutável a competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento da causa.

 

O E. STJ decidiu, em Conflito de Competência, com fundamento no art. 109, I da CF/88, que a mera "presença do Ministério Público Federal no polo ativo da ação civil pública implica, por si só, a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, supramencionado, tendo em vista que se trata de instituição federal" (AgInt no CC 157.073/SP, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, julgado em 13.3.2019, DJe 22.3.2019).

 

Assim, sendo o órgão ministerial federal o autor da ação, ainda que a União Federal não figure na lide, a competência é da Justiça Federal, em razão da pessoa, na forma do art. 109, I da Constituição Federal.

 

 

 

f)  Da possibilidade de reconhecimento incidental de inconstitucionalidade em Ação Civil Pública

 

Conforme se observa da petição inicial, um dos pedidos veiculados pelo Ministério Público Federal é a declaração de incidental da inconstitucionalidade do item 9.2.1.2 do Acordão 1.962/2017 do TCU e itens I e II da decisão cautelar monocrática referendada por meio do Acórdão 1518/2018 do TCU.

 

Não se olvida que o E. STF possui entendimento no sentido de que "A ação civil pública não pode ter por objeto a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos" (REsp 760.034/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 5.3.2009, DJe 18.3.2009).

 

Não obstante, a Suprema Corte igualmente admite que, desde que a declaração de inconstitucionalidade se de forma incidental e prejudicial ao pedido principal, é perfeitamente possível que esse controle ocorra no âmbito das ações civis públicas, in verbis:

 

E M E N T A: RECLAMAÇÃO - EMBARGOS  DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE - QUESTÃO PREJUDICIAL - POSSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA  DE  USURPAÇÃO  DA  COMPETÊNCIA  DO  SUPREMO  TRIBUNAL


 

 

FEDERAL  -  PRECEDENTES  -  RECURSO  DE  AGRAVO  IMPROVIDO.  -  O  Supremo

Tribunal Federal tem reconhecido a legitimidade da utilização da ação civil pública como instrumento idôneo de fiscalização incidental de constitucionalidade, pela via difusa, de quaisquer leis ou atos do Poder Público, mesmo quando contestados em  face  da Constituição da República, desde que, nesse  processo  coletivo,  a  controvérsia constitucional, longe de identificar-se como objeto único da demanda, qualifique-se como simples questão prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal. Precedentes. Doutrina. (Rcl 1898 ED, Relator(a): CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 10/06/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-151  DIVULG 05-08-2014  PUBLIC 06-08-2014)

 

Nesse sentido, saliento, mais uma vez, que a presente Ação Civil Pública tem por objeto principal garantir a subvinculação prevista no ADCT, art. 60, XII, com a utilização de pelo menos 60% de todos os recursos oriundos do precatório oriundo das complementações das verbas do FUNDEF no pagamento dos profissionais do magistério da educação básica que, nos exercícios financeiros e meses correspondentes ao precatório, exerciam efetivamente a atividade.

 

O pedido de declaração de inconstitucionalidade dos trechos de acórdãos do TCU que estipularam justamente o oposto do que previsto no ADCT - ou seja, a desnecessidade de subvinculação das referidas verbas - não constitui, portanto, o objeto principal da demanda.

 

O controle de constitucionalidade difuso dar-se-á tão somente de forma incidental, haja vista ser prejudicial à apreciação do pedido principal. Isso porque a análise da obrigatoriedade, ou não, da subvinculação das verbas do precatório aos profissionais do magistério perpassa, inevitavelmente, pela análise da constitucionalidade do posicionamento do TCU, empeço apto a gerar insegurança jurídica quanto à destinação de valores pelo Município réu.

 

Por fim, saliente-se que a presente análise de constitucionalidade não fará coisa julgada material, por se tratar de controle incidental e difuso.

 

Dessa forma, nada obstante tenha a petição inicial indicado a declaração de constitucionalidade de trechos dos acórdãos do TCU como objeto da ação, a leitura atenta do pedido denota que a pretensão material é incidental e não constitui o objeto principal da demanda.

 

Passo ao exame do mérito.

 

 

 

g)  Do mérito

 

g.1)  Da delimitação do objeto

 

O Ministério Público Federal, na exordial, trata de dois os principais pontos, a saber:

 

(i)  a vinculação da verba oriunda do FUNDEF/FUNDEB ao custeio da educação básica, mesmo quando os referidos valores decorrem de diferenças do FUNDEF/FUNDEB que a União deixou de repassar aos Municípios a tempo e modo, pagos por meio de ação judicial; e

 

(ii)   a subvinculação do montante ao pagamento  dos profissionais do magistério, na proporção de pelo menos 60%, conforme o art. 60, XII do ADCT.

 

Cumpre esclarecer, entretanto, que, quanto a primeiro ponto, este juízo deve se abster de seu exame, uma vez que coisa julgada material acerca da vinculação do precatório judicial à educação, em decorrência de acordo homologado no cumprimento de sentença de n.º 0001628-77.2005.4.05.8308, em que foi firmado o seguinte:

 

1)  Aplicar as verbas exclusivamente na manutenção do desenvolvimento do ensino e valorização do magistério, em atenção ao art. 2o e T da Lei 9424/96, art. 60, XII do ADCT e art. 8°, parágrafo único da Lei Complementar 101/2000;

 

2)  Não efetuar saque de valores em espécie ou de efetuar transferências bancárias para outras contas de titularidade do Município, obrigando-se a realizar transferências para prestadores ou fornecedores


 

 

devidamente identificados, respeitadas as normas financias sobre a execução ordinária de despesas, previstas na Lei n.° 4.320/1964 e Lei Complementar n.° 101/2000;

 

3)  Não pagar honorários advocatícios com tais recursos, ou de utilizar os recursos em despesas não consideradas como de manutenção e desenvolvimento da educação básica.

 

Dessa forma, resta, nesta demanda, a análise do pedido de fixação de multa de 1% sobre o valor utilizado sem observância da vinculação, a ser suportado pelo patrimônio pessoal do prefeito municipal, bem como a subvinculação do montante ao pagamento dos profissionais do magistério, na proporção de pelo menos 60%, conforme o art. 60, XII do ADCT.

 

 

 

g.2)  Da criação do Fundef/Fundeb e do pedido de fixação de multa pela não observância da vinculação à educação

 

O FUNDEF foi criado, no âmbito dos Estados e Municípios, por meio da Lei 9.424/1996, de forma  a disciplinar o art. 60 do ADCT, com a redação dada pela Emenda 14/1996. O intuito de sua criação foi a promoção, em nível nacional, do desenvolvimento das ações na área de Educação, a fim de universalizar o atendimento a este tão importante direito social, com enfoque no desenvolvimento do ensino fundamental e remuneração mais digna aos seus respectivos professores.

 

Contudo, o fundo foi limitado à vigência do art. 60 do ADCT, na redação que lhe deu a EC 14/1996, ao prazo de 10 (dez) anos.

 

Após o escoamento do prazo, esse Fundo foi substituído pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB, criado pela EC 56/2006, que deu nova redação ao referido art. 60 do ADCT, com a disciplina própria ali estabelecida da Lei 11.494/2007.

 

As verbas decorrentes do FUNDEF correspondiam a recursos integrantes de um fundo contábil destinado à manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental e  da  valorização  do  magistério,  conforme  se extrai da leitura dos dispositivos constitucionais e legais que à época regiam o ato.

 

Confira-se o disposto nos artigos 60 do ADCT (redação dada pela EC 14/96) e art. da Lei 9.424/96:

 

Art. 60. Nos dez primeiros anos da promulgação desta Emenda, os Estados,  o  Distrito Federal e os Municípios destinarão não menos de sessenta por cento dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal, à manutenção e ao desenvolvimento do ensino fundamental, com o objetivo de assegurar a universalização de seu atendimento e a remuneração condigna do magistério. (Redação dada pela Emenda Constitucional 14, de 1996)

 

§ A distribuição de responsabilidades e recursos entre os Estados e seus Municípios a ser concretizada com parte dos recursos definidos neste artigo, na forma do disposto no art. 211 da Constituição Federal, é assegurada mediante a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do  Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, de natureza contábil. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 14, de 1996)

 

Art. Os recursos do Fundo serão aplicados na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental público, e na valorização de seu Magistério. (Vide Medida Provisória n. 339, de 2006). (Revogado pela Lei n. 11.494, de 2007)

 

O caráter vinculado dos referidos recursos também ficou consagrado com a criação do FUNDEB, segundo se constata da redação do art. 60 do ADCT dada pela EC 53/2006 e do art. 23, I, da Lei 11.494/07. Vejamos:

 

Art. 60. Até o 14º (décimo quarto) ano a partir da promulgação  desta  Emenda Constitucional, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios destinarão parte dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento da educação básica e à remuneração condigna dos trabalhadores da educação, respeitadas


 

 

as seguintes disposições: (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 53, de 2006). (Vide Emenda Constitucional n. 53, de 2006)

 

Art. 23. É vedada a utilização dos recursos dos Fundos:

 

I - no  financiamento das despesas não consideradas como de manutenção e desenvolvimento da educação básica, conforme o art. 71 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996;

 

Por sua vez, o disposto no artigo da Lei 11.494/07 prevê expressamente o caso de vinculação da verba complementar do FUNDEF/FUNDEB, dispondo que "A complementação da União destina-se exclusivamente a assegurar recursos financeiros aos Fundos, aplicando-se o disposto no caput do art. 160 da Constituição Federal".

 

Verifica-se, desta forma, que os recursos do FUNDEF/FUNDEB encontram-se constitucional e legalmente vinculados a uma destinação específica, sendo vedada a sua utilização em despesa diversa da manutenção e desenvolvimento da educação básica.

 

Dessa forma, conclui-se que se trata de vinculação constitucional que não permite flexibilização nem pelo legislador infraconstitucional, nem pelo Poder Judiciário. Tampouco cabe ao administrador público atuar com discricionariedade na aplicação  dos  recursos do FUNDEBF/FUNDEB recebidos da União, mesmo quando a receita seja repassada a partir de decisão judicial.

 

Insta destacar que, em recente decisão exarada no âmbito do Supremo Tribunal Federal ao apreciar o ARE

1.122.529 AgR/PE, a Corte acolheu em parte o recurso extraordinário manejado pela União, para manter a "vinculação necessária entre as verbas complementares da  União e a manutenção  e desenvolvimento da educação básica e na valorização dos profissionais da educação, inclusive no tocante ao honorários advocatícios contratuais".

 

Ademais, o Egrégio Tribunal Regional Federal da Região também vem corroborando o entendimento acima esposado, vejamos:

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO.  AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APLICAÇÃO DO MONTANTE INTEGRAL DO CRÉDITO ORIUNDO DA AÇÃO AJUIZADA COM VISTAS À COMPLEMENTAÇÃO DAS VERBAS DO FUNDEF/FUNDEB NA MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO. AUSÊNCIA DE DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA PARA A DEFINIÇÃO DE OUTRA FORMA DE APLICAÇÃO DOS VALORE. PRECEDENTES. REMESSA NECESSÁRIA IMPROVIDA.

 

1.  Trata-se de remessa necessária tida por interposta contra sentença que, em sede de Ação Civil Pública, julgou procedente o pedido, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para determinar ao Município réu que aplique integralmente os valores oriundos do Precatório 136062/AL exclusivamente na área da educação fundamental.

 

2.   Em se discutindo sobre a aplicação de verbas inerentes ao FUNDEB, programa do governo federal no campo da educação, não se pode afastar a legitimidade e o interesse da União e, por conseguinte, a competência da Justiça Federal para o julgamento da Ação Civil Pública.

 

3.      O cerne da presente controvérsia consiste em perquirir se as diferenças da complementação do VMNA, repassadas pela União em decorrência de condenação judicial, teriam natureza indenizatória, porquanto destinada à recomposição dos recursos, de forma a serem aplicados de forma indistinta pelo Município, ou, ao contrário, tratar-se-iam de verba vinculada a uma finalidade específica, uma vez que o pagamento por intermédio de precatório seria questão circunstancial, não afetando a natureza ou destinação da verba.

 

4.   A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na sessão  do  dia  10.10.2018, firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de sua retenção em crédito do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB/FUNDEF) concedido por via judicial em razão da necessidade de sua vinculação ao desenvolvimento da Educação. Entendeu aquela Corte, no julgamento do Resp 1.703.697/PE, que as verbas são afetadas constitucionalmente à educação, não podendo ter sua destinação alterada. Nesse sentido, ainda, AgInt no Respe 1634207/PB, rel.


 

 

Ministro GURGEL DE FARIA, DJe 26.03.2019; AgInt no Resp 1736176/AL, rel. ministro Herman Benjamin, DJe 22.04.2019.

 

5.  Também esta Corte Regional tem se manifestado no sentido da vinculação dos recursos para as finalidades do FUNDEF/FUNDEB, embora recebidos por decisão judicial. Precedentes: PROCESSO: 08012072220164058000, AGTAC - Agravo Interno na  Apelação Cível - DESEMBARGADOR FEDERAL LEONARDO AUGUSTO NUNES COUTINHO (CONVOCADO), Turma, JULGAMENTO: 30/10/2019.  PROCESSO: 08133172620184050000, AG - Agravo de Instrumento - , DESEMBARGADOR FEDERAL MANUEL MAIA (CONVOCADO), Turma, JULGAMENTO: 30/07/2019.

 

6.  Remessa necessária improvida.

 

(PROCESSO:  08003670620164058002,   APELREEX  -   Apelação   /  Reexame  Necessário   -

,DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL ERHARDT, Turma, JULGAMENTO: 12/03/2020, PUBLICAÇÃO: )

 

Nesse sentido, também foi o acordo homologado no cumprimento de sentença de n.º 0001628-77.2005.4.05.8308, comprometendo-se o município a observar a vinculação dos valores à educação. No entanto, na ocasião, não foi imposta qualquer sanção ao descumprimento do acordo.

 

Assim, entendo fundamental a fixação de multa, com fins a compelir o município réu a se comprometer em utilizar os valores decorrentes do precatório judicial para fomento da educação.

 

Afinal, trata-se de um contexto de vultuoso montante liberado ao município, acompanhado do dever do gestor em observar os mandamentos constitucionais e comandos judiciais, de forma que a fixação de multa visa a reforçar o dever de probidade e correta aplicação de verbas.

 

No mais, em última análise, a imposição  de multa é, em verdade, uma tentativa de impedir  qualquer desvio e, consequentemente, esvaziamento de recursos a serem aplicados no direito à educação dos munícipes.

 

De todo o exposto, entendo ideal a fixação de multa de 1% sobre eventual valor utilizado sem observância da vinculação, o qual deve ser suportado pelo patrimônio pessoal do prefeito municipal.

 

Consigno, por fim, que a multa será de responsabilidade do prefeito municipal, visto que este é o gestor responsável pela aplicação dos recursos, de modo que eventual desvio ou improbidade perpetrada deve ser sancionada com seu patrimônio pessoal, e não com o do ente municipal, que significaria atingir os interesses da própria população.

 

Como é sabido, o desempenho de uma função pública requer do agente público o fiel cumprimento aos princípios da administração e, em especial à legalidade e à Constituição Federal, de modo que o agente público está obrigado a fazer o que a ordem jurídica determina.

 

Dessa forma, necessária é a medida de coerção, autorizada pelo permissivo do art. 139, IV do Código de Processo Civil.

 

 

 

e.3) Da subvinculação e da inconstitucionalidade dos acórdãos do TCU

 

Conforme explanado, o FUNDEF foi criado por meio da Lei 9.424/1996, a fim de disciplinar o art. 60 do ADCT, com a redação dada pela Emenda 14/1996. Transcrevo, mais uma vez, os referidos dispositivos:

 

Art. 60. Nos dez primeiros anos da promulgação desta Emenda, os Estados,  o  Distrito Federal e os Municípios destinarão não menos de sessenta por cento dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal, à manutenção e ao desenvolvimento do ensino fundamental, com o objetivo de assegurar a universalização de seu atendimento e a remuneração condigna do magistério. (Redação dada pela Emenda Constitucional 14, de 1996)

 

§ A distribuição de responsabilidades e recursos entre os Estados e seus Municípios a ser


 

 

concretizada com parte dos recursos definidos neste artigo, na forma do disposto no art. 211 da Constituição Federal, é assegurada mediante a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do  Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, de natureza contábil. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 14, de 1996)

 

Art. Os recursos do Fundo serão aplicados na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental público, e na valorização de seu Magistério. (Vide Medida Provisória n. 339, de 2006). (Revogado pela Lei n. 11.494, de 2007)

 

Após o escoamento do prazo de 10 (dez) anos, esse Fundo foi substituído pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB, criado pela EC 56/2006, que deu nova redação ao referido art. 60 do ADCT, conforme se observa a seguir:

 

Art. 60. Até o 14º (décimo quarto) ano a partir da promulgação  desta  Emenda Constitucional, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios destinarão parte dos recursos a que se refere o caput do art. 212 da Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento da educação básica e à remuneração condigna dos trabalhadores da educação, respeitadas as seguintes disposições: (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 53, de 2006). (Vide Emenda Constitucional n. 53, de 2006)

 

I - a distribuição dos recursos e de responsabilidades entre o Distrito Federal, os Estados e seus Municípios é assegurada mediante a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB, de natureza contábil; (...)

 

XII - proporção não inferior a 60% (sessenta por cento) de cada Fundo referido no inciso I do caput deste artigo será destinada ao pagamento dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício. (Incluído pela Emenda  Constitucional    53,  de 2006).

 

Nesse mesmo sentido, previu o art. 22 da Lei 11.494/2007 o seguinte:

 

Art. 22. Pelo menos 60% (sessenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos serão destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério  da  educação básica em efetivo exercício na rede pública.

 

Ora, a simples leitura da previsão do então art. 60, XII do ADCT e do art. 22 da Lei 11.494/2007, demonstra a existência de um mandamento constitucional de se observar a subvinculação do montante dos recursos do FUNDEF/FUNDEB ao pagamento dos profissionais do magistério, na proporção de pelo menos 60%.

 

Entretanto, cinge-se a questão em saber se o cumprimento extemporâneo do repasse das verbas ao fundo - somente após ordem judicial - seria suficiente à desnaturação dessa subvinculação ou se permanece hígido o comando constitucional de subvinculação.

 

Importante se faz transcrever a decisão proferida no AGTR 0808173-03.2020.4.05.0000:

 

"Decerto, nada obstante se venha entendendo que as diferenças dos créditos do FUNDEF/FUNDEB devam ser destinadas à educação, esse fato não importa em reconhecer, de forma automática, que deva ser garantida a subvinculação de 60% dos valores obtidos na via judicial para pagamento de remuneração dos profissionais do magistério em exercício na municipalidade.

 

Tal se porque os recursos em foco têm natureza extraordinária, ou seja, são valores advindos da complementação da União, obtidos pela via judicial e pagos por precatório a ser expedido ao final da demanda, situação que afasta a subvinculação estabelecida no art. 22 da Lei 11.494/2007."

 

Com muita clareza, a referida decisão expôs a natureza extraordinária dos recursos aqui discutidos, uma vez que decorrem de valores complementados pela União, em razão de processo judicial e pagos por precatório.

 

No  entanto,  em  meu  sentir,  o  reconhecimento  da  garantia  de  subvinculação  dos  60%  não  é  mera


 

 

consequência automática, mas decorre de uma análise cuidadosa e, em última análise, lógica, além de ser fundada na segurança jurídica. Explico.

 

É que o simples fato de a obrigação pecuniária não ter sido cumprida espontaneamente, mas somente após decisão judicial com trânsito em julgado, não descaracteriza a sua natureza nem a da prestação correspondente.

 

Como visto, a subvinculação de 60%, destinada aos profissionais do magistério, é regramento constitucional previsto no art. 60, XII do ADCT, o qual impõe a observância da "proporção não inferior a 60% (sessenta por cento) de cada Fundo referido no inciso I do caput deste artigo será destinada ao pagamento  dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício".

 

Assim, a simples leitura do dispositivo, partindo-se de uma interpretação gramatical/literal, autoriza, por si só, concluir pela subvinculação das verbas do FUNDEF/FUNDEB, uma vez que não ressalvas quanto a complementação realizada a destempo.

 

No mais, a razão de ser do dispositivo foi claramente exposta no próprio caput do art. 60 do ADCT, ao propor que o FUNDEF/FUNDEB prestará não à manutenção e ao desenvolvimento da educação básica, mas como também deve servir "à remuneração condigna dos trabalhadores da educação".

 

Desse modo, a conclusão não é diferente quando se propõe uma interpretação teleológica do art. 60 do ADCT, sendo certo que a norma fora estipulada com a finalidade de garantir que parte da verba federal seja destinada ao pagamento de professores.

 

Sendo certo que, ao lado do desenvolvimento da educação básica, a valorização dos profissionais  da educação foi um dos objetivos da criação do FUNDEB, é desarrazoado supor que o comando de valorização caia por terra tão somente porque a Administração não logrou êxito em  realizar, oportunamente, o repasse de valores aos profissionais do magistério.

 

Afinal, a complementação dos repasses a destempo decorreu de falha, atribuída à União Federal, que, ao longo de quase uma década, promoveu repasses a menor.

 

Significa isso dizer que, desde 1998 até o presente momento, os professores e, em última  análise,  a educação municipal, tem suportado o ônus dessa falha, que inúmeras são as resistências impostas pela União para evitar que aufiram as verbas que lhe teriam sido destinadas de forma não legítima, mas constitucional.

 

Pensar de forma diferente seria inovar o ordenamento jurídico tão somente pelo decurso de longo prazo de tempo, ou porque foi necessária a intervenção do Judiciário para dar efetividade à medida, invertendo-se a própria lógica da política pública. Afinal, as ações judiciais que culminaram com a expedição de inúmeros precatórios não tiveram por objetivo o mero repasse de verbas pela União aos Municípios, sem qualquer vinculação.

 

A complementação fora feita no âmbito do FUNDEB, que, repita-se, possui contornos específicos, com individualização do quantitativo dos percentuais e a finalidade a que se destinavam.

 

Afinal, se o pagamento a destempo não desnaturou a natureza vinculada da verba à manutenção e desenvolvimento da educação básica - conforme decidido pelo STJ no REsp 1686339/PE e pelo STF no ARE 1.122.529 AgR/PE para fins de destaque de honorários advocatícios - seria desarrazoado concluir que desnaturou a subvinculação dos 60% destinados aos professores. Esse, aliás, é o pensamento lógico - e não meramente automático - e que valoriza a segurança jurídica e a razão de ser do próprio FUNDEF/FUNDEB.

 

Não é por outra razão que o próprio Poder Legislativo Federal representado pelo Congresso Nacional manifestou-se favorável à subvinculação dos recursos advindos de precatórios  do  FUNDEF/FUNDEB (Ofício 51/2019/ CFFC-P), nos termos do art. 21, da Lei 11.494/2007, e na Constituição Federal, no art. 60 do ADCT.

 

Almejando-se, ainda, maior segurança no que toca ao destino das verbas em questão, também foi editado o Projeto de Lei 5.733/19, o qual determina que pelo menos 60% dos recursos oriundos de precatórios do antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério


 

 

(FUNDEF) deverão ser rateados entre os professores da educação básica da rede pública do ente (estado ou município) beneficiado.

 

Por todo o exposto, é imperioso concluir pela existência de evidente inconstitucionalidade do Acórdão 1.962/2017 - TCU - Plenário, no item 9.2.1.2, o qual afirma que:

 

9.2.1.2. a natureza extraordinária dos recursos advindos da complementação da União obtida pela via judicial afasta a subvinculação estabelecida no art. 22 da Lei 11.494/2007;

 

Da mesma forma, reconheço a manifesta inconstitucionalidade do Acórdão 1518/2018 - TCU - Plenário, especificamente os itens I e II da decisão cautelar monocrática referendada; bem como do item 9.2.1 do Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário, a saber:

 

I)  determino, cautelarmente, nos termos do artigo 276, caput, do Regimento Interno/TCU, aos entes municipais e estaduais beneficiários de precatórios provenientes da diferença no cálculo da complementação devida pela União, no âmbito do Fundef, que se abstenham de utilizar tais recursos no pagamento a profissionais do magistério ou a quaisquer outros servidores públicos, a qualquer título, a exemplo de remuneração, salário, abono ou rateio, até que este Tribunal decida sobre o mérito das questões suscitadas no presente feito;

 

II)    alerto os entes municipais e estaduais referidos no item anterior que a não observância dos entendimentos manifestos nos Acórdãos 1824/2017TCU-Plenário e 1962/2017-TCU Plenário, bem como nos presentes autos, pode ensejar a responsabilização, pelo Tribunal de Contas da União, dos agentes públicos que lhe derem causa;

 

9.2.1. além de não estarem submetidos à subvinculação de 60%, prevista no artigo 22 da Lei 11.494/2007, consoante o subitem 9.2.1.2, Acórdão 1962/2017 - Plenário, não podem ser utilizados para pagamentos de rateios, abonos indenizatórios, passivos trabalhistas ou previdenciários, remunerações ordinárias, ou de outras denominações de mesma natureza, aos profissionais da educação;

 

Isso porque os referidos comandos do TCU são claramente inconstitucionais, ao vedar a subvinculação de 60% de precatórios judiciais pagos em decorrência de complementação de repasses do FUNDEF/FUNDEB, enquanto o art. 60 do ADCT expressamente dispõe essa subvinculação.

 

Em verdade, mais do que inconstitucionais, os acórdãos do TCU causam consequências nefastas para a educação dos Estados e Municípios, por desconsiderar o papel central do profissional do magistério na construção de uma sociedade justa, democrática e igualitária, todos esses objetivos da República Federativa do Brasil. Ora, mais do que investimentos em estrutura - aliás, garantidos pela subvinculação de 40% do FUNDEF/FUNDEB - é imprescindível que o juízo concretize a vontade emanada do constituinte, valorizando o profissional do magistério, o que perpassa pela remuneração justa.

 

Neste ponto, o IDEB - índice calculado com base no aprendizado em português e matemática dos alunos (Prova Brasil) e no fluxo escolar (taxa de aprovação) - da rede municipal de Ouricuri sequer atingiu a meta estabelecida  para  o  município  (QEdu,  disponível  em  https://www.qedu.org.br/cidade/3770-ouricuri

/ideb).

 

No mais, tem-se que, no Brasil, 56% dos alunos aprenderam o adequado, no que diz respeito à leitura e a interpretação de textos até o ano na rede pública de ensino. em Pernambuco, esse índice é de somente 42%. Ouricuri, por sua vez, detém a proporção severamente crítica de 18% (QEdu, disponível em https://www.qedu.org.br/cidade/3770-ouricuri/compare).

 

Ademais, o que se verifica é que, no Brasil, os profissionais do magistério são pouco valorizados, visto que recebem baixas remunerações, situação que é agravada ainda mais em áreas rurais e urbanas não metropolitanas.

 

Inclusive, diante da realidade da educação em municípios com extensa zona rural, como o caso do Município de Ouricuri, a remuneração justa deve ser considerada não como fator de valorização dos professores, mas também como estímulo necessário a tornar mais atrativo o exercício do magistério na zona rural, considerando as dificuldades que lhe são inerentes.


 

 

Em 2015, apurou-se que o rendimento total de professor da rede municipal de educação básica com uma única ocupação no Brasil era de: R$2.492,00, na região metropolitana; R$ 1.894,00, na região urbana não metropolitana; e R$1.433,00 na zona rural (IPEA, disponível em http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream

/11058/7929/1/td_2304.pdf).

 

Essas médias de valores são ainda menores na região nordeste, em que se verifica o rendimento total de R$2.139,00 na área metropolitana, R$ 1.632,00 na área urbana não metropolitana e R$ 1.255,00 na zona rural (IPEA,  disponível  em  http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/7929/1/td_2304.pdf).

 

em nível mundial, tem-se que, dentre os países que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o Brasil possui uma das menores médias de salários pagos a professores (OECD, disponível em https://www.oecd.org/education/education-at-a-glance/EAG2019_CN_BRA.pdf, tradução livre).

 

Como se vê, o Brasil está longe de alcançar os indicadores para propiciar a todos os seus cidadãos um desenvolvimento sustentável e igualitário. Chama, ainda, a atenção o fato de que o nível educacional das escolas privadas é muito superior ao das escolas públicas, o que é fator decisivo na perpetuação da desigualdade social.

 

A própria existência de uma política pública afirmativa para ingresso de alunos  oriundos  de  escolas públicas em Universidades Federais (Lei 12.711/12) denota o reconhecimento  de uma desigualdade estrutural entre os cidadãos brasileiros a impor medidas  verdadeiramente  concretas  para  superação desse cenário.

 

Por fim, a par de todos os argumentos jurídicos, estatísticos e sociais a justificar a subvinculação, entendo que a pretensão ministerial vai ao encontro do o bj et ivo 4 da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, subscrita pelo Estado Brasileiro, que preconiza que, até o ano de 2030, deve ser assegurada educação de qualidade a todos.

 

Noutro giro, forçoso consignar ser de interesse do próprio município destinar 60% desses valores aos profissionais do magistério da educação básica que, nos exercícios financeiros e meses correspondentes ao precatório, exerciam efetivamente a atividade.

 

Ora, é preciso se atentar ao fato de que os valores percebidos da União pelo Município a título de complementação aos repasses do FUNDEB vão se incorporar ao patrimônio da municipalidade, que goza de autonomia dentro do pacto federativo. Aliás, o Município de Ouricuri editou lei municipal estabelecendo a forma de rateio dos recursos, nos seguintes termos:

 

Art. 1º. Fica o Chefe do Poder Executivo do município de Ouricuri/PE, autorizado a firmar acordo no processo judicial número 0001628-77.2005.4.05.830, em tramitação na 27ª Vara federal, seção de Ouricuri, visando o pagamento aos professores da rede  municipal  de ensino, ativos nos anos/exercícios entre outubro do ano 2000, a dezembro de 2006 (período contemplado no processo judicial que originou o precatório do processo acima citado), correspondente ao percentual de 60% (sessenta por cento) do valor remanescente do referido precatório.

 

PARÁGRAFO ÚNICO: este acordo entrará em vigor no primeiro dia útil após o trânsito e julgado da homologação judicial citada no caput.

 

Art. 2º. O pagamento do valor destinado a cada professor da rede pública municipal de ensino será realizado em conformidade com as diretrizes estabelecidas pelo sindicato Municipal da categoria, em conjunto com o Chefe do poder Executivo Municipal, da seguinte maneira:

 

§1° O rateio será realizado conforme exercícios financeiros e meses correspondentes ao precatório, e divididos na proporção de tempo efetivamente exercido.

 

§2° O pagamento de que trata o caput deste artigo poderá ser efetivado mediante depósito em conta bancária vinculada ao salário de cada professor beneficiário, ou por meio de depósito judicial.


 

 

a)  será destinada a importância de R$ 300.000.00 (trezentos mil reais), desse recurso, para criação de fundo de reserva temporário, no intuito de garantir o mesmo direito aos profissionais do magistério que por ventura perderam o prazo de habilitação para recebimento do beneficio objeto desta lei.

 

b)  O fundo de reserva citado em alínea anterior será destituído, 06 meses após sua criação, e terá seu saldo positivo rateado na mesma forma dos demais valores tratados nesta lei.

 

§3° Entende-se por professores beneficiários os discriminados nas alíneas a seguir, sempre respeitando a proporcionalidade, se for o caso, do tempo de serviço desempenhado em sala de aula durante o interstício de outubro do ano 2000, a dezembro de 2006, devendo haver a respectiva comprovação:

 

a)  estatutários do período, e na ativa, independente do período de investidura no cargo;

 

b)  aposentados, desde que tenha laborado no período outubro do ano 2000 a dezembro de 2006.

 

Art. 3º. Após a homologação judicial do acordo regulamentado por esta Lei, deverá ser diligenciada a extinção com julgamento do mérito, dos feitos com objetos semelhantes, inclusive eventuais recursos interpostos antes ou depois da entrada em vigor da presente lei.

 

Art. 4o. Para fins de cumprimento do acordo avençado nesta Lei, fica autorizado o Chefe do Poder Executivo Municipal a criar ou suplementar mediante Decreto, dotação orçamentária específica em total cumprimento às normas previstas na Constituição Federal, na Lei n.º 4.320/1964 e Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei complementar n.º 101/2000).

 

Art. 5o. O ajuste tratado nesta Lei é celebrado por discricionariedade da Administração Pública Municipal e não enseja reconhecimento automático do direito pleiteado nos processos judiciais mencionados nos artigos anteriores, e nos que poderão, eventualmente, ser ajuizados.

 

Art. 6º. Esta lei entra em vigor na data do sua publicação revogadas as disposições em contrário.

 

Se é certo que o Município de Ouricuri não poderá gastar os  recursos de qualquer forma, posto estar vinculado aos princípios e regras constitucionais do FUNDEF/FUNDEB, bem  como  na  legislação  de caráter nacional, do mesmo modo não é dado à União intervir indevidamente na política de gastos dos recursos pertencentes ao próprio município, cabendo ao TCU tão somente fiscalizar os recursos federais sem, contudo, se sobrepor ao mandamento constitucional no que tange à vinculação dos gastos.

 

Com efeito, a procedência é medida que se impõe.

 

 

 

DISPOSITIVO

 

Por todo o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido autoral (art. 487, I, do Código de Processo Civil) para:

 

(i)   declarar, inci de nt al mente, a inconstitucionalidade incidental do item 9.2.1.2 do acórdão 1.962/2017 - TCU - Plenário; dos itens I e II da decisão cautelar monocrática referendada no Acórdão 1518/2018 - TCU - Plenário; e do item 9.2.1 do Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário.

 

(ii)     determinar ao Município de Ouricuri que, ao utilizar as verbas do precatório decorrente do FUNDEF/FUNDEB,  observe:

 

(a)   a vinculação na aplicação exclusiva na educação, sob pena de multa de 1% sobre o valor utilizado em qualquer área que não seja a educação, a ser suportado pelo prefeito do município de Ouricuri.

 

(b)    a subvinculação prevista no art. 60, XII do ADCT, devendo destinar pelo menos  60%  de  todos  os recursos oriundos do precatório no pagamento dos profissionais do magistério da educação básica que, nos


 

 

exercícios financeiros e meses correspondentes ao precatório, exerciam efetivamente a atividade e na proporção de tempo que o fez, sob pena de multa de 1% sobre o valor utilizado sem a subvinculação, a ser suportado pelo prefeito municipal de Ouricuri. Em caso de óbito, os valores devem ser destinados aos sucessores.

 

(iii)  determinar que o Município de Ouricuri, no prazo de 60 (sessenta) dias, elabore um plano de aplicação dos recursos, conforme a recomendação contida no Acórdão 2866/2018 - TCU - Plenário, o que deverá ser feito em participação com o sindicato dos professores no tocante aos 60% subvinculados. Deverá o referido plano ter ampla divulgação, devendo o Município promover, no que diz respeito ao plano:

 

(a)  a ciência do respectivo conselho do FUNDEB;

 

(b)  a ciência dos membros do Poder Legislativo local;

 

(c)  a ciência da comunidade diretamente envolvida; e

 

(d)  a sua juntada nos autos, no prazo concedido para a sua elaboração.

 

 

 

DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

 

No que diz respeito à tutela antecipada, deferida por este juízo liminarmente e suspensa, em parte, por decisão monocrática liminar proferida no Agravo de Instrumento de n.º 0808016-30.2020.4.05.0000, esclareço que, dado o seu caráter provisório, é naturalmente substituída pela tutela definitiva, ora deferida.

 

Nesse sentido o recente precedente do TRF5, encampando entendimento da Corte Especial do STJ:

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DECISÃO QUE NÃO CONHECEU DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA NA AÇÃO ORIGINÁRIA. PERDA DO OBJETO. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

 

1.  Agravo interno interposto contra decisão que não conheceu do agravo de instrumento, em razão da perda do objeto, diante da superveniência de sentença na ação originária.

 

2. Como consignado na decisão recorrida, a Corte Especial do STJ decidiu que "na específica hipótese de deferimento ou indeferimento da  antecipação  de  tutela,  a prolatação de sentença meritória implica a perda de objeto do agravo de instrumento por ausência superveniente de interesse recursal, uma vez que: a) a sentença de procedência do pedido - que substitui a decisão deferitória da tutela de urgência - torna-se plenamente eficaz ante o recebimento da apelação tão somente no efeito devolutivo, permitindo desde logo a execução provisória do julgado (art. 520, VII, do Código de Processo Civil); b) a sentença de improcedência do pedido tem o condão de revogar a decisão concessiva da antecipação, ante a existência de evidente antinomia entre elas" (STJ, EAREsp 488.188/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe de 19/11/2015).

 

3.  Logo, é de se reconhecer que a decisão ora agravada encontra-se em conformidade com julgado da Corte Especial do STJ.

 

4.  Ainda a corroborar a prejudicialidade do agravo de instrumento, o recurso de apelação interposto contra a sentença prolatada nos autos principais foi julgado e o acórdão transitou em julgado, conforme consulta ao sítio eletrônico de informação processual desta Corte Regional.

 

5.   Agravo interno improvido. Manutenção da decisão que não conheceu do agravo de instrumento. (PROCESSO: 08034882120184050000, AG - Agravo de Instrumento - , DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO, Turma, JULGAMENTO: 13/07/2020, PUBLICAÇÃO: )

 

O entendimento ampara-se no juízo de cognição exauriente em que se baseia a sentença meritória, que


 

 

tratamento definitivo à controvérsia e absorve, assim, os efeitos da medida antecipatória.

 

Conforme elucidado pelo E. Relator do AGTR, a subvinculação dos 60% do precatório judicial em questão para pagamento dos profissionais do magistério não deve ser reconhecida "de forma automática", pelo que vislumbrou-se "ao menos nesta análise primeva do recurso, a legitimidade dos acórdãos do TCU", o que deu ensejo a suspensão parcial da medida liminar anteriormente concedida por este Juízo.

 

Contudo, após análise acurada do contexto fático e probatório que permeia os autos da presente ação civil pública, em verdadeiro juízo de cognição exauriente, bem como considerando, ainda, que subsiste  o interesse autoral  em ter a tutela provisória confirmada - para  que a  presente sentença  produza efeitos imediatamente, nos termos do art. 1.012, §1º, V, do CPC -, confirmo a antecipação dos efeitos da tutela, por todos os argumentos expostos neste decisum, que se somam àqueles ventilados por ocasião da decisão liminar.

 

Nada obsta, contudo, que seja atribuído efeito suspensivo a eventual recurso de apelação interposto.

 

Outrossim, uma vez que o mérito do Agravo de Instrumento n.º 0808016-30.2020.4.05.0000 ainda não foi julgado, não prejuízo de que, decidindo-se sobre perda ou não do objeto recursal, o E. TRF5 decida acerca da suspensão dos efeitos das decisões proferidas nestes autos.

 

Traslade-se cópia desta sentença para os autos do processo n.º 0001628-77.2005.4.05.8308. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na Distribuição.

De imediato, oficie-se ao eminente relator ao Agravo de Instrumento interposto pela União, comunicando-lhe a prolação desta sentença, bem como a ordem de exclusão do ente federal da lide.

 

Sentença não sujeita à remessa necessária, nos termos do art. 18 da Lei de Ação Popular.

 

Deixo de condenar o réu no pagamento das custas processuais, nos termos do art. 4º, I da Lei n.º 9.289/96.

 

Deixo também de condenar o réu em honorários advocatícios de sucumbência, em razão da simetria, uma vez que descabe a condenação da parte autora, salvo comprovada má-fé, na forma do art. 18 da Lei n.º 7.347/85  (STJ,  AgInt  no  REsp  1582209/RS,  Rel.  Ministro  FRANCISCO  FALCÃO,  SEGUNDA  TURMA,

julgado em 04/08/2020, DJe 07/08/2020). Sentença publicada e registrada eletronicamente. Ouricuri, data da assinatura eletrônica.

 

 

FLÁVIA HORA OLIVEIRA DE MENDONÇA

Juíza Federal Substituta no exercício da titularidade plena

 

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